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Foto do escritorFilipa Melo

Inquisição ibérica – Um Livro Por Dia



Ódio à solta

Toby Green mostra o terror da Inquisição ibérica como nunca o vimos.

A perseguição, a tortura e a execução praticadas como uma arte. A «pedagogia do medo» utilizada como instrumento político capaz de subjugar as vontades de Roma e contaminar até as mais distantes colónias de Portugal e de Espanha. A religião usada como desculpa e totalmente rendida ao poder. Em quatro continentes e durante três séculos (entre 1478 e 1834, estabelecimento e abolição em Espanha), a devastadora Inquisição ibérica afirmou-se como «a primeira instituição opressora da História», fonte das «primeiras sementes do estado totalitário, do abuso racial e sexual». Reconhecêmo-lo no estudo, de 2007, A Inquisição, assinado por Tony Green e, até à data, a mais acessível e abrangente abordagem ao que este investigador inglês dá o subtítulo de O Reino do Medo.

As motivações para a Inquisição ibérica foram muito mais complexas do que as da Inquisição papal ou da primeira Inquisição medieval. Partiram da perseguição religiosa, ao cristão-novo e ao mourisco, mas tornaram-se sobretudo políticas. Toby Green encontra aí, e na subordinação ao poder real, a base para o tratamento simultâneo das realidades espanhola e portuguesa. A «vasta tipificação dos crimes», os movimentos de adesão e resistência, o aparelho do medo ou a burocracia do sistema surgem contextualizados a partir de múltiplos exemplos criteriosamente escolhidos e sustentados. A Inquisição, O Reino do Medo explora testemunhos, personagens e pequenas histórias, todas chocantes. Em conjunto, compõem um fresco vívido, uma tenebrosa narração de leitura fácil e compulsiva.

É impressionante o registo das práticas de denúncia e do princípio do sigilo (os nomes dos acusadores não eram divulgados). A paranóia da confissão, aliada ao terror da fogueira e ao dogma da tortura (horrendas, a do trato de polé ou a da água), levava os acusados a denunciarem até membros da própria família. A «distorção da justiça» permitia abusos inconcebíveis de poder e incentivava a invenção e a suspeição. No caso português, destaca-se a descrição do ‘pogrom’ de 1506 e da «mistura de brutalidade e de bondade» do rei D. Manuel. Toby Green consegue mostrar a Inquisição como uma forma social autofágica que, no final, é consumida pelo próprio medo e sucedida por rastos recalcados de amargura.

A Inquisição – O Reino do Medo, Toby Green, Editorial Presença, 511 págs.


SOL/ 13-08-2010

© Filipa Melo (interdita reprodução integral sem autorização prévia)

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